Policial

Lava Jato chega ao governo do Paraná

Diretor do DER é preso acusado de receber propina para aumentar tarifa de pedágio no Estado

Curitiba – A 48ª fase da Operação da Lava Jato, batizada de Integração, deflagrada ontem, sacudiu o governo do Paraná. Dentre os seis presos, está o diretor-geral do DER-PR (Departamento de Estradas de Rodagem no Paraná), Nelson Leal. As suspeitas são de que o diretor tenha recebido propina da concessionária Econorte, do grupo Triunfo, para aprovar aditivos que resultaram no aumento da tarifa de pedágio cobrada na rodovia que constitui o chamado Anel de Integração.

O assessor da Casa Civil, Carlos Felisberto Nasser, só não foi preso devido à idade, mas também foi alvo da operação. Ele é acusado de receber R$ 2,8 via “empresa sem empregados” (leia mais na página ao lado).

A operação envolveu a Polícia Federal, o Ministério Público e a Receita Federal.

Segundo os investigadores, Nelson Leal adquiriu “de forma oculta” um apartamento de luxo em Balneário Camboriú, em Santa Catarina, no valor de R$ 2,5 milhões. Desse total, “aproximadamente R$ 500 mil foram pagos em espécie ou com recursos cuja origem não foi identificada nas contas do investigado”, informou o procurador Diogo Castor de Mattos, do Ministério Público no Paraná. Leal teria sido beneficiado também com o pagamento do aluguel de um iate de luxo.

Cúpula do governo

O DER é subordinado à Secretaria de Infraestrutura do Estado, que tem à frente o irmão do governador Beto Richa, José Richa Filho.

Em entrevista coletiva, o procurador Diogo disse que está investigando “aditivos dos quais participam vários servidores públicos” do Estado do Paraná, o que deve expandir o caso para outras concessionárias.

Os procuradores afirmaram que não é possível confirmar envolvimento de atores políticos no esquema, mesmo por negligência. Eles não mencionaram o nome do governador do Paraná. “Sempre reiteramos que a Lava Jato não tem cunho partidário. Nossa questão é investigar corrupção. Fatos envolvendo o PSDB estão sendo revelados há muito tempo. Não creio que haja diferença de tratamento em relação a qualquer partido”, afirmou o procurador Carlos Fernando Lima ao ser questionado sobre a relação da operação com os partidos.

As investigações

Investigações feitas em novembro de 2016 pelo MP indicaram que o grupo ligado à concessionária responsável pelo Anel de Integração usou operadores financeiros já investigados pela Lava Jato – no caso, Rodrigo Tacla Duran e Adir Assad. Os operadores auxiliavam o grupo na produção de dinheiro em espécie ou na operacionalização de pagamentos de propina no exterior por intermédio de movimentação entre contas offshores.

A Econorte depositou mais de R$ 1 milhão em favor de Tacla Duran entre 2012 e 2014. Na época, foi comprovado que tais valores foram repassados sem que qualquer tipo de serviço tivesse sido prestado. Outras empresas relacionadas ao Grupo Triunfo depositaram mais R$ 5 milhões na conta de Rodrigo Tacla Duran, além de R$ 26 milhões para empresas de fachada do operador financeiro Adir Assad.

Ainda conforme o Ministério Público, dados da quebra de sigilo bancário judicialmente autorizada demonstraram que, entre 2005 e 2015, a concessionária recebeu R$ 2,3 bilhões provenientes de tarifas pagas. Desse total, R$ 343 milhões foram repassadas a uma subsidiária em contratos de conservação de rodovias, que enviou R$ 110 milhões à holding do grupo, e “pelo menos R$ 63 milhões a empresas de fachada ou sociedades cuja prestação de serviços ou entrega de produtos não foi comprovada, acrescentou o MP.

Fraude tributária

Segundo o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, o caso envolvendo a concessão da rodovia à iniciativa privada representa um “claro indicativo de que privatizações não necessariamente levam ao fim da corrupção”, uma vez que há “sérios indícios de pagamentos e desvios que chegam a servidores públicos”.

Ele acrescentou que as despesas apresentadas pela Econorte geraram fraude tributária, o que foi confirmado pelo auditor fiscal da Receita Federal Roberto Leonel: “Uma das concessionárias pagou despesas a uma subsidiária que, na verdade, é uma empresa irmã. Toda a receita dessa empresa vinha dessa concessionária que atendia praticamente 70% de toda despesa operacional. Isso resulta na redução do lucro tributável”, disse o auditor da Receita durante a entrevista à imprensa.

“Ferida aberta”

O procurador Carlos Fernando Lima disse ontem que a investigação se debruça sobre uma “ferida aberta”. “Simplesmente é a tentativa de investigar uma ferida aberta no Paraná, que são as altas tarifas do pedágio”, afirmou. “Estamos tentando aprofundar as reais causas no Paraná, o preço tão elevado. Privatizações não necessariamente levam ao fim da corrupção. Há indicativos sérios de pagamentos a funcionários públicos. Há agentes públicos, não agentes políticos envolvidos por enquanto”.

Beto pede que Controladoria investigue caso

Em nota divulgada pela Secretaria de Comunicação, o governador Beto Richa informou que determinou "pronta instauração de processo de investigação para esclarecimento de eventuais irregularidades apontadas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal". A investigação será conduzida pela Controladoria-Geral do Estado.

De acordo com a nota, tanto os contratos quanto os aditivos relacionados ao chamado Anel de Integração foram conduzidos pelo DER, e todos terminaram submetidos ao crivo da Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Infraestrutura do Paraná, que homologou seus termos.

"Quanto aos fatos que envolvem o sr. Carlos Nasser, [o governo do Paraná] esclarece que ele exercia a função de assessor político junto à Casa Civil, cargo de terceiro escalão, sem qualquer vínculo com o Gabinete do Governador. Em razão disso, o governador determinou o seu imediato afastamento do cargo, até a apuração completa dos fatos", concluiu a nota.

Detalhes da Operação Integração

*Policiais federais cumpriram 55 mandados de busca e apreensão e seis de prisão temporária em quatro estados: Paraná, Santa Catarina, Rio de Janeiro e São Paulo.

*A investigação apura casos de corrupção ligados aos contratos de concessão de rodovias federais no Estado que fazem parte do Anel da Integração, hoje composto por 27 praças de cobrança.

*A investigação apura desvios de pelo menos R$ 63 milhões e chegou à sede do governo do Estado.

*Foram presos ontem Nelson Leal Júnior, diretor-geral do DER; Oscar Alberto Gayer da Silva, ex-funcionário do DER; Wellington de Melo Volpato, sócio da Eco Sul Brasil Construtora; Hélio Ogama, diretor-presidente da Triunfo Econorte; Leonardo Guerra, administrador da empresa Rio Tibagi; e Sandro Antônio de Lima, diretor financeiro da Triunfo Participações. Um dos investigados está fora do País. O nome dele é Paulo Garcez Beckert.

*A investigação se debruça sobre o Grupo Triunfo, dono da Econorte.

*Dados da quebra de sigilo bancário demonstraram que, entre 2005 e 2015, a Econorte recebeu R$ 2,3 bilhões provenientes de tarifas, dos quais R$ 343 milhões foram repassados para uma subsidiária integral em contratos de conservação; da subsidiária integral, R$ 110 milhões foram repassados a holding do grupo e pelo menos R$ 63 milhões a empresas de fachada ou sociedades cuja prestação de serviços ou entrega de produtos não foi comprovada.

*A Receita Federal conseguiu identificar pelo menos R$ 56 milhões em desvios por meio de serviços fictícios.

*Perícia revela que houve sobrepreço de 89% em relação ao valor de mercado; para o MPF, essa “gordura” era usada para pagamentos indevidos.

*Em 2012, o DER contratou uma empresa para analisar os contratos e sugeriu redução de 18% da tarifa, mas o próprio DER descartou o estudo. Na época, a Econorte foi favorecida por dois termos aditivos e um termo de ajuste que aumentaram a tarifa paga em mais de 25%.

*O procurador Diogo Castor de Mattos afirmou que o valor desviado “pode passar de R$ 100 milhões”.

 

Rodrigo Duran nega irregularidades

Em nota assinada de Madir, Rodrigo Duran nega quaisquer irregularidades e diz que, apesar de várias investigações e fiscalizações em seus estabelecimentos empresariais, não houve denúncias contra ele nem suas empresas. “Nunca sofri qualquer condenação criminal e tenho colaborado com a Justiça Espanhola e de diversos países. Embora o procurador Douglas Fischer, da Secretaria de Cooperação Internacional do Ministério Público Federal, tenha recomendado o envio para a Espanha de supostas provas contra mim em poder do juiz Sérgio Moro e dos procuradores de Curitiba, conforme determinam acordos e tratados internacionais, até hoje isso não foi feito ao arrepio da lei”.

Confira a íntegra da nota: 

 

Nota de esclarecimento
1. No dia 25 de abril de 2017, após dez pedidos de prorrogação de uma investigação iniciada em 14 de julho de 2015, a Receita Federal encerrou o procedimento de fiscalização contra meu escritório de advocacia sem lavrar auto de infração. Ou seja: toda minha movimentação financeira foi corretamente declarada e os respectivos impostos recolhidos.
2. Conforme certidão emitida pela Receita Federal no dia 20 de fevereiro de 2018, anteontem, o escritório Tacla Duran Sociedade de Advogados tem situação fiscal regular.
3. Todos os trabalhos prestados para o Grupo Triunfo foram indevidamente apreendidos em novembro de 2016, durante busca e apreensão ilegal autorizada pelo juiz Sérgio Moro, desrespeitando o sigilo profissional e outras prerrogativas, conforme despacho da presidência da OAB-SP.
4. Sou espanhol, vivo em Madri com minha família, meu endereço é conhecido pelas autoridades espanholas e brasileiras. O juiz Sergio Moro tem meu endereço. A Justiça espanhola negou minha extradição e, no dia 19 de dezembro de 2017, a Receita Federal da Espanha encerrou fiscalização contra mim concluindo que eu não cometi qualquer irregularidade ou delito.
5. Nunca sofri qualquer condenação criminal e tenho colaborado com a Justiça Espanhola e de diversos países. Embora o procurador Douglas Fischer, da Secretaria de Cooperação Internacional do Ministério Público Federal, tenha recomendado o envio para a Espanha de supostas provas contra mim em poder do juiz Sérgio Moro e dos procuradores de Curitiba, conforme determinam acordos e tratados internacionais, até hoje isso não foi feito ao arrepio da lei.
6. Há uma denúncia apresentada por parlamentares junto à Procuradoria Geral da República, requerendo investigação sobre irregularidades ocorridas durante negociações do meu acordo de colaboração com a Força Tarefa do Paraná em março de 2016, o que torna impedidos tanto os procuradores da Lava Jato, quanto o juiz Sergio Moro, de conduzirem processos e investigações contra mim, uma vez que todos têm interesse direto no desfecho de quaisquer causas envolvendo meu nome.
Madri, 22 de fevereiro de 2018.
Rodrigo Tacla Duran

 

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