Cotidiano

Boicote de embarcadores pode parar autônomos

Profissionais temem represália ante a aplicação de multas para quem não cumprir tabela do frete

Cascavel – Com a fixação das multas pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) publicadas nessa sexta-feira (9) no Diário Oficial da União, todos os atores do processo envolvidos no embarque e no transporte de cargas ficam sujeitos a punição que pode chegar a R$ 10,5 mil. A regulamentação ocorre cinco meses após a tabela de fretes entrar em vigor, resultado de reivindicação para pôr fim à greve dos caminhoneiros em maio.

Segundo o presidente do Sindicam (Sindicato dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens da Região Oeste do Paraná), Jeová Pereira, os profissionais autônomos esboçam preocupação, mas ele recomenda que todos se mantenham firmes na exigência legal.

Só que tanto motoristas quanto sindicato dão como certo o boicote de embarcadores neste fim de ano como forma de pressão para o não cumprimento do preço mínimo do frete. “Contamos com essa possibilidade e temos recomendado ao motorista que, se isso acontecer, que ele não se desespere, que encoste o caminhão e fique com ele parado até o ano que vem. Que vá descansar, viajar, cuidar da família, fazer reparos no caminhão”, sugere.

Questionado se essa medida não poderia provocar um colapso no transporte, Jeová reforça que não, tendo em vista que o maior fluxo de carga nesta reta final de ano vale para itens frigorificados e industrializados, devido à entressafra, com poucos grãos para escoar. “Não causaria um colapso e isso daria tempo para os embarcadores pensarem, refletirem e irem se adequando aos preços do frete, adaptando-se para voltarem a transportar ano que vem [no escoamento da safra de verão de soja e milho] cumprindo o preço mínimo do frete”, destacou.

Jeová reforça ainda que o motorista deve manter “pulso firme” no momento da contratação do transporte. “O motorista não pode ser frouxo. Se o embarcador não quiser pagar, que ele denuncie para o órgão que o representa ou para o órgão fiscalizador. É história que as indústrias vão comprar frota própria. Ela é completamente inviável, cara demais, não se sustenta e o embarcador só ganha dinheiro com a contratação de terceiros para o transporte. Sem contar que o caminhão está em tudo. Então, o caminhoneiro que siga a tabela e exija que o embarcador faça isso também”, completou.

Multas para todos os envolvidos

O não cumprimento da tabela do frete determina penalização em quatro diferentes situações, considerando que os valores, segundo a ANTT, passaram por consulta pública.

Assim, quem contratar o transporte por valor inferior à determinação da tabela, a multa será de duas vezes a diferença entre o valor pago e o piso devido, com valor mínimo de R$ 550 e podendo chegar a R$ 10,5 mil.

Ao transportador que carregar com valor inferior ao mínimo, a multa será de R$ 550.

Quem fizer anúncios ofertando a contratação do transporte rodoviário de carga em valor inferior ao piso mínimo terá multa de R$ 4.975.

Os transportadores responsáveis por anúncios ou outros agentes do mercado que impedirem, obstruírem ou de qualquer forma dificultarem o acesso às informações e aos documentos solicitados pela fiscalização para verificação da regularidade do pagamento do valor de frete poderão sofrer multa de R$ 5 mil.

Jeová Pereira reforça ainda que de nada adianta a fixação das multas se a fiscalização não for mais assídua. “Não podemos ficar só na dependência da ANTT. Por que o Ministério Público e o Ministério do Trabalho não participam dessa fiscalização nos postos da Polícia Rodoviária Federal então?”.

Entre as formas de fiscalização previstas na resolução está a averiguação, pela ANTT, do documento que caracteriza a operação de transporte, de documentos fiscais a ele relacionados e das informações utilizadas na geração do Código Identificador da Operação de Transporte para comprovação da infração prevista do artigo.

A fiscalização já vinha sendo feita, mas, segundo o sindicato que representa a categoria, de forma falha e sem rotina de atividade. Além disso, nenhuma das autuações havia gerado multa porque faltava a regulamentação das punições, essa mesma que foi publicada nessa sexta-feira no Diário Oficial.

Para o presidente do Sintropar (Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas do Oeste do Paraná), Wagner Adriani de Souza Pinto, é importante destacar que agora todos os atores do processo podem ser penalizados: “Isso vale para o embarcador, para a transportadora, para o autônomo, ninguém mais escapa disso, nem as empresas de agenciamento online que também ficam sujeitas à multa”.

“A reação do mercado à aplicação da tabela foi muito forte e muitas empresas recuaram na aplicação da tabela e se submeteram ao mercado, arriscando ficar com um passivo judicial, e jogaram com a sorte na possível interpretação da inconstitucionalidade da lei. O que nos parece é que a ANTT, nessa resolução, reforça ainda mais a tendência de não recuar em relação à aplicação da tabela mínima, ao contrario, ela intimida por meio da imposição de multa aos demais atores do processo”, avalia Wagner, ao reafirmar que agora o passivo não é apenas do transportador.